CONFLITO E CONSTRUÇÃO DE RISCOS NA SOCIEDADE COMPLEXA E GLOBALIZADA: O CASO DA DERIVA DO HERBICIDA 2,4-D

Haide Maria Hupffer, João Alcione Sganderla Figueiredo, André Rafael Weyermüller

Resumo


O desenvolvimento da agricultura, baseado hoje no uso indiscriminado de agrotóxicos, criou uma nova realidade em que a dependência da própria tecnologia representa um risco futuro, na medida em que não se pode precisar até que ponto ela irá compensar os passivos ambientais criados para o seu desenvolvimento. Organizou-se o artigo a partir de teóricos que trabalham a temática da globalização policêntrica dos riscos ambientais e o difícil diálogo entre tecnologia, ciência, economia, política e meio ambiente para, com estes subsídios, observar o conflito entre produtores de uvas e produtores de soja do estado do Rio Grande do Sul sobre os efeitos da deriva do herbicida 2,4-D para cultivares de culturas sensíveis, como base fática para uma reflexão. A análise evidenciou que há um conflito que deixou de ser silencioso e que ganhou novos contornos ao envolver produtores agrícolas em lados opostos. As primeiras ações tomadas pelo Sistema Político remetem apenas ao aplicador do produto das lavouras de soja a responsabilidade, enquanto que, para a grande indústria produtora de agrotóxicos não recai nenhuma ação. Decisões como a de não responsabilizar o fabricante do herbicida 2,4-D pelos danos da deriva às culturas sensíveis são aceitas pelo fato de que a exigência posta pelo mercado não é uma exigência moral, mas sim, é institucionalizada e amparada pelo sistema legal e político.


Palavras-chave


Percepção de Risco; Agrotóxico; Herbicida 2,4-D; Efeitos da Deriva; Vitivinicultura.

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DOI: http://dx.doi.org/10.26668/IndexLawJournals/2358-1352/2020.v25i10.5697

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