A MIGRAÇÃO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DO POSSÍVEL ENTRE A ALEMANHA E O BRASIL

Matheus Gomes Setti, Melina Girardi Fachin

Resumo


Embora a reserva do possível já seja conhecida no direito pátrio há muitos anos, ainda não se conseguiu encontrar limites e parâmetros para a sua aplicação. Com vistas a contribuir, de alguma forma, à problematização, o presente trabalho se propõe a analisar as principais diferenças do conceito da reserva do possível em sua versão alemã, onde se originou, e brasileira. Para tanto, partirá dos estudos de direito constitucional comparado, sobretudo relativos à migração de ideias constitucionais, e utilizará o método de revisão bibliográfica de ambos os países, em português e alemão, sem pretensão exauriente. Será traçado um panorama do ordenamento alemão relativo aos direitos fundamentais e sociais – que lá não são dotados de fundamentalidade –, bem como exploradas as principais formulações germânicas acerca do mínimo existencial e da reserva do possível. Ao final, verificará que há de fato divergências essenciais entre os institutos, as quais derivam principalmente do sistema constitucional de direitos fundamentais e das formas de proteção à dignidade humana.


Palavras-chave


Reserva do possível; Mínimo existencial; Vorbehalt des Möglichen; Direito comparado; Migrações constitucionais; Direitos sociais.

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DOI: http://dx.doi.org/10.26668/IndexLawJournals/2358-1352/2023.v35i13.8460

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