DO ATIVISMO PARA O EXTREMISMO JUDICIAL NAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA

Débora Ferreira Carneiro

Resumo


A base dos estados constitucionais está na separação dos poderes. Com a evolução dos estados modernos, a partir das teorias do neoconstitucionalismo, a separação tornou-se mais fluída, com o objetivo de dar maior efetividade aos direitos fundamentais garantidos na constituição. A partir desse momento, o Poder Judiciário abandona a inércia inicial e ganha força em decisões mais efetivas. O protagonismo judicial, chamado de ativismo judiciário, pode ser um importante mecanismo dos cidadãos para proteção dos seus direitos contra a inércia legislativa e a burocracia executiva. Contudo, os juízes quando excedem no poder decisório, podem desrespeitar a tripartição de poderes. Esse movimento de extremismo judicial é prejudicial ao Estado Democrático de Direito. É fácil perceber essas posições extremadas em relação às políticas públicas relacionadas ao direito à saúde. O Estado juiz extremista, desrespeita as políticas públicas, desrespeita o orçamento público, desrespeita os direitos da coletividade e impõem obrigações à Administração, sem a avaliação das consequências e sem que isso gere justiça social efetiva. Em relação às políticas públicas relacionadas à assistência farmacêutica, a Administração Pública acumula sucessivas derrotas judiciais, pois, praticamente todos os pedidos de fornecimento de medicamentos são concedidos. Comportamento que se tornou generalizado no país. Quem mais lucra é a indústria farmacêutica, que garante um mercado consumidor aberto, livre de questionamentos e rentável, com as decisões judiciais. É necessário um diálogo amplo entre o poder judiciário, a Administração pública, médicos, órgãos de controle e sociedade civil para que os direitos fundamentais sejam garantidos de forma eficiente e justa.


Palavras-chave


ativismo judicial. extremismo judicial. políticas públicas. direito à saúde, assistência farmacêutica.

Texto completo:

PDF

Referências


ALEXY, R. Teoria dos direitos fundamentais. 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2015. 669p.

ALVAREZ, L. Judicialização de la política y soberania popular: sobre el estatuto político de las resoluciones judiciales. Revista Crítica de Ciências Sociais, Coimbra, v. 108, p. 95–110, dez. 2015.

AMARAL, G.; MELO, D. Há direitos acima dos orçamentos? In: SARLET, I. W.; TIMM, L. B. (org). Direitos Fundamentais: orçamento e “reserva do possível”. 2. Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. 412p. p.79–100.

ARNAUD, A-J; CAPELLER, W. Cidadania e direito à saúde. In: COSTA, A. B.; SOUSA JUNIOR, J. G. de; DELDUQUE, M. C. et al (org) O Direito achado na rua: Introdução crítica ao direito à saúde. Brasília: CEAD/UnB, 2009. 406p. p. 31-47.

ARNOLD, R.; ESTOY, J. I. M.; URBINA, F. Z. El principio de proporcionalidade em la jurisprudência del Tribunal Constitucional. Estudios Constitucionales, Chile, año 10, n. 1, p. 65–116, 2012.

ASSIS, V. H. S. de O controle judicial das políticas públicas: a problemática da efetivação dos direitos fundamentais sociais. Espaço Jurídico, Joaçaba, v. 13, n. 2, p. 283-296, jul./dez. 2012.

BARBOSA, K. de S.; SILVEIRA, R. dos R. O retorno do rei: as mutações na clássica divisão de poderes pela judicialização nas relações sociais e ativismo judicial. Revista Jurídica, Gestão e Administração da Justiça, Curitiba, v. 2, n. 2, p. 191 – 213, jul./dez. 2016.

BARROSO, L. R. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. [Syn]Thesis, Rio de Janeiro, v. 5, n. 1, p. 23-32, 2012.

BERNAL-CANO, N. El poder creador del juez em la combinación o mezcla de los procedimentos constitucionales. Revista Estudios Sócio-Jurídicos, Colombia, v. 12, n. 1, p. 11-34, 2010.

CAETANO, R.; SILVA, R. M. da; PEDRO, E. M. et al. Incorporação de novos medicamentos pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS, 2012 a junho de 2016. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 8, p. 2513-2525, 2017.

CARNEIRO, D. F. Direito à saúde e judicialização da assistência farmacêutica. RDJ Revista de Doutrina e Jurisprudência, Brasília, v. 108, n.2, p. 278-292, jan.-jun. 2017.

CAVALCANTI, A. D. Ativismo judicial ou criação judicial do direito? O papel da corte constitucional nas omissões constitucionais – uma análise comparativa. Revista de Direito Brasileira RDB, São Paulo, SP, v. 16, n. 7, p. 79-95, jan/abr. 2017.

CHIEFFI, A. L., BARRADAS, R. de C. B., GOLBAUM, M. Legal access to medications: a threat to Brazil’s public health system? BMC Health Services Research, Reino Unido, v. 17, p. 499-511, 2017.

CÔRTES, V. A. P. V. Ativismo judicial do neoconstitucionalismo ao neoprocessualismo. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP, Rio de Janeiro, v.6, n. 6, p. 546–571, 2010. Disponível em: < www.redp.com.br>. Acesso em 18 dez 2017.

D’ESPÍNDULA, T. C. de A. S. Judicialização da medicina no acesso a medicamentos: reflexões bioéticas. Rev. Bioét. (impr), Brasília, v. 21, n. 3, p. 438-447, 2013.

DALLARI, S. G. Controle judicial da política de assistência farmacêutica: direito, ciência e técnica. Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 57-75, 2010.

DANTAS, P. R. de F. Direito processual constitucional. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2015. 556p.

FERNANDES, R. L.; NELSON, R. A. R. R. Da capacidade de inovação normativa do poder judiciário: uma análise a partir do sistema jurídico brasileiro. Revista Prólegomenos Derecho y Valores, Nova Granada, v. 20, n. 39, p. 11–28, 2017.

FIGUEIREDO, E. F. de; GIBRAN, S. M. O ativismo judicial, o princípio da separação dos poderes e a ideia de democracia. Percurso, Curitiba, v. 1, n. 18, p. 104–124, 2016.

FREIRE JÚNIOR, A. B. O controle judicial de políticas São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 140p.

FRIEDE, R. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

GARCIA, E. Conflito entre normas constitucionais: Esboço de uma teoria geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. 612p.

GOMES, L de M. A saúde como objeto de consumo: uma análise sobre as demandas e consultas públicas de incorporação de medicamentos no SUS. Cad. Ibero-Amer. Dir. Sanit, Brasília, v. 4, n. 4, out./dez., p. 145-163 2015.

GUIMARÃES, I. S. Ativismo judicial e o problema metodológico da discricionariedade judicial para a formação de uma política criminal. Universitas Jus, Brasília, v. 25, n. 2, p. 1–14, 2014.

JUÁREZ, M. G. Formas del Estado de Derecho y Delimitación del Derecho al Buen Gobierno. ARBOR Ciencia, Pensamento y Cultura, Madrid, CLXXXVI, n. 745, p. 901-915, sept.-oct. 2010.

KOERNER, A. Ativismo judicial? Jurisprudência constitucional e política no STF pós-88. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, v. 96, p. 69-85, julho. 2013.

KOZEN, L. A justiciabilidade dos direitos sociais: considerações a respeito da eficácia jurídico-subjetiva dos direitos fundamentais. Espaço Jurídico, Joaçaba, v. 11, n. 1, p. 63-90, jan./jun. 2010.

LAUENROTH, V. D.; STARGARDT, T. Pharmaceutical pricing in Germany: how is value determined within the scope of AMNOG? Value in Health, v. 20, p. 927-935, 2017.

LEAL, M. C. H. Corte Interamericana de Direitos Humanos e jurisdição constitucional: judicialização e ativismo judicial em face da proteção dos direitos humanos e fundamentais? Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba,v. 1, n. 3, p. 123 – 140, set./dez. 2014.

LEAL, M. C. H.; BOLESINA, I. Fundamentação, jurisdição constitucional e direitos fundamentais – um estudo de caso. Espaço Jurídico Jornal of law, Chapecó, v. 14, n. 2, p. 511-532, jul./dez. 2013.

LIMBERGER, T. NOGUEIRA, A. de C. Neoconstitucionalismo: o alicerce do ativismo judicial brasileiro. Revista Direito e Liberdade – RDL – ESMARN, Rio Grande do Norte, v. 19, n. 1, p. 263–289, jan./abr. 2017.

MACHADO, F. R. de S.; DAIN, S. A audiência pública da saúde: questões para judicialização e para a gestão de saúde no Brasil. Rev. Adm. Pública, Rio de Janeiro, v. 46, n. 4, p. 1017-1036, jul./ago. 2012.

MAGALHÃES, G. G. C. V. de. A configuração pós-moderna dos direitos fundamentais sociais: uma análise da ingerência jurisdicional no âmbito de efetivação desses direitos. RIDB, Lisboa, ano 1, n. 5, p. 2849–2889, 2012. Disponível em: < http://www.idb-fdul.com/ >. Acesso em 21 out 2017.

MÂNICA, B. F. Teoria da Reserva do Possível: Direitos Fundamentais a Prestações e a Intervenção do Poder Judiciário na Implementação de Políticas Públicas. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n.21, março, abril, maio. 2010. Disponível em: Acesso em: 18 abril 2014.

MANNING, J. F. Separation of powers as ordinary interpretation. Harvard Law Review, Cambridge, v. 124, p. 1939–2036, 2011.

MARQUES, S. B. Judicialização do direito à saúde. Revista de Direito Sanitário, São Paulo, v. 9, n. 2, p. 65-72, jul.-out. 2008.

MARSIGLIA, R. M. G.; SILVEIRA, C.; CARNEIRO JUNIOR, N. Políticas sociais: desilgualdade, universialidade e focalização na saúde no Brasil. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 14, n. 2, p. 69-76, 2005.

MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. São Paulo: Martin Claret, 2007.

MORETTI, D. A. A.; COSTA, Y. F. da A importância do ativismo judicial na implementação dos direitos sociais não implementados pelo poder público. R. Dir. Gar. Fund., Vitória, v. 17, n. 1, p. 111-134, jan./jul. 2016.

NELSON, R. A. R. .R; MEDEIROS, J. T. da S. de. Reflexões sobre o ativismo judicial. Revista de Direito da Uerj – RFD, Rio de Janeiro, n. 27, p. 146-171, 2015.

OCKÉ-REIS, C. O. SUS: o desafio de ser único. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2012. 180p.

OLIVEIRA, A.A.S. de Bioética e Direitos Humanos. São Paulo: Loyola, 2011. 245p.

PAUMGARTTEN, F. J. R. Pharmaceutical lobbying in Brazil: a missing topic in the public health research agenda. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 50, n. 70, p. 1-6, 2016.

PEPE, V. L. E.; VENTURA, M.; SANT’ANA, J. M. B et al Caracterização de demandas judiciais de fornecimento de medicamentos “essenciais” no Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 26, n. 3, p. 461-471, mar. 2010.

PIERRO, B. de. Demandas crescentes. Pesquisa Fapesp 252, São Paulo, p. 18-25, fevereiro, 2017.

PINHEIRO, R.; GUIZARDI, F. L.; MACHADO, F.R.S. et al. Demanda em saúde e direito à saúde: liberdade ou necessidade? Algumas considerações sobre os nexos constituintes das práticas de integralidade. In: PINHEIRO, R.; MATTOS, R. A.(org) Construção social da Demanda. Rio de Janeiro: CEPESC/UERJ:ABRASCO, 2005. 304p. p. 11-31

PINTO, L. H., SCHULTER, L. S., SIERTH, R. et al. O uso racional de medicamentos no Brasil dentro da assistência farmacêutica e suas implicações no presente. Revista Eletrônica de Farmácia, Goiás, v. XII, n. 1, p. 27-43, 2015.

RAMOS, E. M. B.; DINIZ, I. M. Direito à saúde e judicialização: um estudo sobre a eficácia do fórum nacional do Judiciário para a saúde. Revista de Política Judiciária, Gestão e Administração da Justiça, Curitiba, v. 2, n. 2, p. 43-64, jul./dez. 2016.

ROZENFELD, S. Ensaios clínicos e indústria farmacêutica. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 29, n. 12, p. 2368-2370, dez. 2013.

SANT’ANA, J. M. B.; PEPE, V. L. E.; OSÓRIO DE CASTRO, C. G. S. et al. Essencialidade e assistência farmacêutica: considerações sobre o acesso a medicamentos mediante ações judiciais no Brasil. Rev. Panam. Salud Publica, Washington, v. 29, n. 2, p. 138-144, 2011.

SARLET, I. W. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 12 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015. 512p.

SARLET, I. W.; FIGUEIREDO, M. F. Notas sobre direito fundamental à proteção e promoção da saúde na ordem jurídico-constitucional brasileira. In: ASENSI, F. D.; PINHEIRO, R. (org) Direito Sanitário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. 614 p. p. 27-69.

SAVI, L. A.; SANTOS, E. S. O papel do administrador público nas demandas judiciais no serviço de assistências farmacêutica. Cad. Ibero-Amer. Dir. Sanit., Brasília, v. 2, n. 2, p. 404-420, jul./ dez. 2013.

SILVA, J. B.; JUCATELLI, J. P. Judicialização da saúde, ativismo judicial e o consequente desequilíbrio do orçamento público. Rev. Bras. Polít.Públicas, (online), Brasília, v. 7, n. 1, p. 89–105, abril 2017.

STANFORD, A.; CAVALCANTI, M. Decisões judiciais sobre acesso aos medicamentos em Pernambuco. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v.46, n. 5, p. 791-799, 2012.

STRAPAZZON, C. L.; GOLDSCHMIDT, R. Teoria constitucional e ativismo político: problemas de teoria e de prática com direitos fundamentais sociais. Revista Facultad de Derecho y Ciencias Políticas, Bolívia,v. 43, n. 119, p. 567-624, enero-junio. 2013.

STRECK, L. L.; BARRETO, V. de P.; OLIVEIRA, R.T. de Ulisses e o canto das sereias: sobre ativismo judiciais e os perigos da inauguração de um “terceiro turno constituinte”. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito (RECHTD), São Leopoldo, v. 1, n.2, p. 75-83, jul.-dez. 2009.

TEIXEIRA, A. V. Ativismo judicial: nos limites entre racionalidade jurídica e decisão política. Revista Direito GV, São Paulo, v.8, n.1, I, p. 37–58, jan.-jun. 2012.

TIMM, L. B. Qual a maneira mais eficiente de prover direitos fundamentais: uma perspectiva de direito e economia? In: SARLET, I. W.; TIMM, L. B. (org.). Direitos Fundamentais: orçamento e “reserva do possível”. 2.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. 412p. p.51–62.

VARGAS-PELÁEZ, C. M.; ROVER, M. R. M.; LEITE, S. N. et al. Right to health, essencial medicines, and lawsuits for access to medicines – a scoping study. Social Science & Medicine, v. 121, p. 48-55, 2014.

VARGAS-PELÁEZ, C. M.; SOARES, L.; ROVER, M. R. M. et al. Towards a theorical model on medicines as a health need. Social Science & Medicine, v. 178, p. 167-174, 2017.

VILLALOBOS, M. F. El nuevo protagonism de los jueces: uma propuesta para el análisis del activism judicial. Revista de Derecho Universidad Católica del Norte, Antofagasta, año 22, n. 2, p. 173–198, 2015.

WANG, D. W. L.; VASCONCELOS, N. P. de; OLIVEIRA, V. E.; et al. Os impactos da judicialização da saúde no município de São Paulo: gasto público e organização federativa. Rev. Adm. Pública, Rio de Janeiro, v. 48, n. 5, p. 1191–1206, set./out. 2014.




DOI: http://dx.doi.org/10.26668/IndexLawJournals/2358-1352/2018.v20i8.4390

Apontamentos

  • Não há apontamentos.